14 julho, 2007

O Muro

Eram duas. Opostas, como a água e o vinho, únicas na beleza como elas só. Uma ruiva, sardenta, de ar matreiro mas confiante, ultrapassava em muito a altura média de um habitante natural daquelas bandas. De facto, Narima chegava aos dois metros de altura, fazendo sombra a qualquer um dos homens mais fortes da aldeia. Ao seu lado, Mirmara não passava de uma anãzinha, com o seu escasso metro e meio. Morena, de longas tranças ebúrneas, inspirava o terror junto de qualquer criança da aldeia, não pelo trato difícil que lhe era característico, mas por uns olhos verdes incandescentes, que granjearam a fama de bruxa de todas as mulheres da sua família. Juntas, aspiravam ao mesmo sonho de menina sonhadora, candidatas a um punhado de viagens pelo mundo desconhecido e à descoberta de novas gentes e exóticos sabores. Para além do Muro, estava o Mundo, diziam, acalentando a noite que as libertasse das amarras da pequena aldeia de Nunca Vi.
O Muro, imponente, esmagador na sua cinzenta-parda inexpugnabilidade, resistira à voz dos tempos esquecidos e na memória dos Nunca-Vistos ficara só a impossibilidade de o transpor. Existia para conter um Desconhecido perdido algures na tradição oral e a memória dos Anciãos, ou talvez porque, calado, dizia a avó de Narima, o mal não ganha força. Calado o nome, esquecido no tempo, perdido para sempre.
E agora, para aquelas duas meninas aventureiras, o Muro simbolizava a concretização de um sonho...

by Lunaris

(continuará)

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