17 abril, 2006

Hora de ponta

Um dia ia eu na rua.
Ouvindo a multidão que se esmagava a cada passo da hora de ponta, soltavam-se dela frases soltas, palavras desirmanadas do contexto. Compenetrei-me muito bem no meu papel de coscuvilheira e pude entender que "Ele julga que eu sou o quê"..."um macaco da Zâmbia"..."e outros dois martinis já tinha tirado a camisa". Confesso. Ri-me. Deu-me gosto esta cusquice discreta, melhor ainda que andar ao som do meu iPod. Andar sozinha comigo, já ando vezes a mais. E decidi-me continuar no trabalho de espia, pelo menos até ao próximo semáforo: "Duas colheres de margarina"..."já sabes o que a casa gasta"..."deu-me um pontapé na barriga, o cabrão"... "quando fui vê-lo estava com cólicas". Uma narrativa irresistível, não é? Vejamos agora o que me reserva até à lavandaria da esquina... "o Ming fugiu com os pauzinhos"... "antes de me deitar vi tudo verde, a sério, tudo verde e turvo"... "respondi-lhe, vê lá se levas, e logo se calou"..."o cão morreu". Triste esta última parte. Mas foi uma tarde produtiva, afinal de contas. Poderia escrever, talvez, um livro, baseado nos "diálogos" de quem me rodeia na hora de ponta. Será uma coisa demasiado doida? Hmmm... o certo é que me ri bastante. Para a próxima, hei-de me concentrar nos gestos. Os gestos tão são importantes. E até a casa, continuo: "Um dó li tá"... "Joana, já para casa!"... "o senhor José da mercearia foi apanhado com outra"... "Olá, rapariga, que me contas?"...
by Lunaris

4 comentários:

  1. Tens te dedicado mais a prosa... e bem. beijo

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  2. De regresso? Que bom.

    Em relação ao texto, estavas naquilo a que costumo chamar "modo promíscuo"!

    Têm a sua piada, parar para ver a vida a passar de vez em quando.

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  3. De regresso a pouco e pouco, que a universidade não tem permitido muito. Mas vou tentar deleitar-vos mais vezes com os meus tesouros literários :P sim, asidie, acho que a palavra certa é promíscuo (seu tonto :P ), mas eu cá acho-me é coscuvilheira, mesmo. Vão dizer-me que nunca pararam na rua e fizeram o mesmo?Nem ouviram uma conversa atrás de uma porta? Ora, mas que falta que coscuvilhice...

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  4. El vouyerismo me encanta jejejeje. Besitos

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