A legalização do aborto voltou de novo à baila, pela mão de um PS que procura com todas as suas forças granjear as simpatias de um povo desnorteado e que conta todos os tostões até ao fim do mês. Desengane-se, não venho aqui tomar lados políticos, fazer a apologia de defensora da Vida (considero que somos todos defensores), nem marcar a posição de acérrima apologista do aborto.
Vejo-me como muitos portugueses e portuguesas, no limbo entre os dois extremos: a vida é um bem que não devemos renegar, é certo, mas não será importante que essa mesma vida seja recheada das pequenas coisas, mas tão importantes, como a saúde, o amor e a educação, entre outros? Não sou pelo nem contra o aborto, sou a favor da livre escolha, da decisão que a mulher e o seu parceiro devem poder fazer, se assim o desejarem.
A IVG (Interrupção Voluntária da Gravidez) pode tratar-se de uma questão meramente moral e ética, para uns, mas, para outros, trata-se, fundamentalmente, de uma questão de saúde pública, de direitos e de liberdade de opção. As circunstâncias são inúmeras e variadas. Um caso é sempre um caso, e não existe nenhuma mulher à face da terra, que tome tal decisão de ânimo leve. Há sempre uma forte carga psicológica envolvida, factores económicos, circunstâncias de vida em nada favoráveis à vinda de um filho.
É certo que, em alguns casos o aborto poderia ser evitado. Mas isso cabe também ao Estado, que pouco ou nada faz em termos de apoio familiar, psicológico e monetário. É incrível, que, em pleno século XXI, mulheres e crianças (sim crianças, porque há milhares de casos de raparigas dos 11 aos 17 anos que se encontram nesta situação), que por pertencerem a estratos sociais mais baixos, ou de parcos recursos, não possam ter a mesma possibilidade de opção de outras, que o fazem no estrangeiro. Tal ironia não podia ser mais injusta. Está bem patente, e só não vê quem não quer, que esta questão se estende a toda a sociedade, que o aborto, embora escondido e ilegal, é praticado em todo o lado, em condições miseráveis...
Julgamentos atrás de julgamentos… perdoem-me os mais moralistas, lembra-me a caça às bruxas, em tempos mais longínquos. Por mero azar, os seus nomes constavam de uma agenda de contactos, como no caso das 17 mulheres da Maia, e a actividade ilícita da parteira em questão foi denunciada às autoridades, por uma fonte desconhecida. Apenas a profissional de saúde, que foi acusada, entre outras coisas, de exploração e extorsão, foi condenada. Ao menos isso...mas nem isso deveria acontecer no Portugal de hoje. Ficou provado, na decisão do tribunal, que em relação às mulheres que praticaram o aborto, a penalização é, afinal, uma lei sem nexo e sem razão de existir. Todas tiveram os seus factores determinantes e, ainda hoje, vivem na consciência que fizeram o que tinha de ser feito, porque não havia outra maneira de proceder.
Um dia, e espero ainda por cá andar para o poder testemunhar, as próximas gerações irão olhar para trás, estudar a sua história, e deparar-se, afinal, com uma sociedade onde as aparências imperam... Pergunto-lhe, caro leitor, quantas mulheres mais terão de morrer, de sofrer sequelas para o resto da vida, de esconder-se e calar as condições deploráveis em que são feitas certas IVG? E, se continua a achar que não é uma questão de saúde pública... pense então, que a sua filha, a sua irmã, ou que outra mulher bem próxima de si, possa ter passado pelo mesmo e ter tido a “sorte” de sobreviver.
Quando votar no próximo referendo, independemente da sua escolha, reflicta e pondere, mas vote…
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